Foto: Vinicius Becker (Diário)
A publicação do edital de licitação para a concessão do transporte coletivo de Santa Maria, no dia 22 de julho, marcou o início de um processo aguardado há anos. Porém, antes mesmo da data prevista para a concorrência, marcada para 2 de setembro, o edital acabou suspenso. A decisão de adiar a licitação foi tomada pela prefeitura nesta terça (26). Ao vivo no Bom Dia, Cidade! desta quarta (27), o diretor da Associação dos Transportadores Urbanos (ATU), Edmilson Gabardo, classificou o material como um “Frankenstein” e apontou uma série de falhas que, segundo ele, inviabilizavam a participação das empresas.
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— Nós temos condições de participar de licitação, as empresas são sólidas, as nossas empresas têm condições de participar de processos licitatórios. Mas não daquele que foi publicado, porque aquilo não era um processo licitatório, aquilo era um Frankenstein, era um amontoado de papéis. Numa página dizia que a frota ia ter que ser vermelha e branca e na outra página dizia que a frota ia ter que ser azul, preto e branco. Então, não ia dar certo. Era um absurdo, foi alguma coisa feita por duas empresas desqualificadas, com a capacidade técnica duvidosa. E aí só podia dar no que deu.
Gabardo ainda reforça que as inconsistências não foram apontadas apenas pelas empresas. O Conselho Municipal de Transportes e os sindicatos rodoviários também identificaram falhas graves, como o fato de os salários dos trabalhadores não estarem atualizados, mesmo representando cerca de 50% do custo da tarifa.
— Tinha uma série de problemas, então não tinha como dar certo. Não é só para as empresas de Santa Maria, nenhuma empresa do Brasil entenderia, porque ninguém entendeu o que estava escrito. Foi feito um "copia e cola" horrível, pegaram um pedaço de um lado, um pedaço do outro e jogaram em umas páginas.
Ele afirmou que a ATU apontou os s erros identificados e que caberá à prefeitura revisar todo o processo.
— Nós tivemos que apresentar os erros que vimos. A gente não poderia silenciar diante do que estava colocado ali, até pela nossa experiência. É uma obrigação como cidadão identificar esses problemas e mostrar. E sensibilizou o pessoal da comissão de licitação. Agora vamos aguardar os próximos acontecimentos.
Comparação com Curitiba e o risco de tarifa a R$ 10
Ao falar sobre alternativas, Gabardo citou o exemplo de Curitiba, onde o sistema de transporte tem planejamento, investimentos e parcerias de longo prazo. Ele ressaltou que, na capital paranaense, a tarifa foi congelada e novos aportes serão realizados para melhorar a frota, inclusive com eletrificação.
— Hoje, por exemplo, vimos que Curitiba congelou a tarifa em R$ 6 até 2027. Mas Curitiba vai colocar no sistema de transporte público da capital do Paraná, nos próximos 15 anos, R$ 3,9 bilhões. Isso são mais de R$ 20 milhões por mês para investir, para qualificar a frota, para eletrificar a frota. Isso que Curitiba já tem um transporte muito bom. E, para fazer a licitação, eles fizeram parceria com o BNDES, que financiou todos os estudos para melhorar o transporte de Curitiba. Foi um planejamento a longo prazo, com investimentos — comparou.
Na visão dele, a situação em Santa Maria é bem diferente, e o valor projetado equivale ao preço de corridas de carros de aplicativo.
— Aqui inventaram uma tarifa de R$ 7,67. Mas, com aquelas exigências de frota que estavam no edital, a tarifa chegava a R$ 10. Tem condições de pagar R$ 10? R$ 10 é um Uber. Eu moro na Vila Oliveira e para ir até o Centro eu gasto R$ 10 de Uber. Então é impossível.
Quebra de expectativa
O diretor não escondeu a decepção com a situação. Segundo ele, a expectativa em torno de uma nova licitação era antiga, mas que a forma como o edital foi conduzido representou uma frustração para o setor.
— Eu tô muito triste, muito triste, porque a gente espera isso há muito tempo. A gente quer ver as coisas andarem, quer ver as empresas prosperarem, quer ver o usuário feliz. Mas Santa Maria está numa situação bastante difícil economicamente. Temos que ter criatividade e buscar recursos fora, no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Banco Mundial, enfim, e fazer um projeto com empresas idôneas. Nós temos a universidade aqui, inclusive com pós-graduação em transporte, professores qualificados. Temos que utilizar essas ferramentas e fazer um investimento.
Ele também lembrou que Santa Maria já gastou recursos no passado para planejar o setor, mas esse conhecimento não foi levado em consideração no edital publicado.
— Há mais de 10 anos gastaram mais de R$ 3 milhões para fazer um plano diretor de mobilidade urbana. Esse plano indicava que temos que ter linhas troncais, linhas radiais, terminais nos bairros. Essas coisas têm que ser lidas e executadas. Por que se faz uma lei? Para melhorar a vida da cidade. Essas leis têm que ser cumpridas, têm que ser lidas para que tenhamos evolução.
Gabardo afirmou que, se houver uma nova licitação viável e transparente, as empresas de Santa Maria terão interesse em participar.
— Se for viável, se a gente conseguir pelo menos entender o que estiver escrito, é lógico que nós vamos participar. Nós prestamos serviços de transporte em Santa Maria há mais de 50 anos. Mas da forma como estava, era impossível. Do jeito que foi apresentado, não tinha a menor condição.
Até o momento, a licitação foi suspensa por tempo indeterminado.
Veja aqui o que disse a prefeitura sobre a suspensão da licitação.